Mímica é ferramenta para entender papel do corpo no teatro, revela professor da ECA
A mímica não é a arte do silêncio, mas, sim, a
dramaturgia do corpo. É isto o que afirma Eduardo Tessari Coutinho, ator,
pesquisador e professor do Departamento de Artes Cênicas (CAC) da Escola de
Comunicações e Artes (ECA) da USP. Docente da USP desde 1990, ele introduziu o
ensino da mímica na graduação em Artes Cênicas e hoje desenvolve a pesquisa O
texto corporal do ator em cena, sobre dramaturgia corporal, a partir dos princípios
da mímica.
“Dramaturgia corporal é a escrita que o ator faz
com seu próprio corpo em cena”, explica Coutinho, que argumenta que a voz faz
parte do corpo, e que, por isso, a mímica não deve ser entendida apenas como a
arte do silêncio. Qualquer espetáculo, mesmo falado, pode contar com esse
elemento combinado a tantos outros. A construção da cena depende da dramaturgia
de cada ator, independentemente do estilo e estética do espetáculo.
É este o aspecto da mímica estudado por
Coutinho: sua inserção no todo. “Na pesquisa não faço a dissociação entre texto
e corpo. Isto é, a dramaturgia do ator puxa esses elementos. Há horas em que o
que conta é o movimento, em outras é o que se fala, ou os próprios elementos da
encenação”, conta ele.
A mímica e seus componentes sempre estiveram
presentes na história do teatro. Coutinho explica que o mimo (o ator que se
utiliza de técnicas da mímica) marcou épocas como a Antiguidade Greco-romana e
a Idade Média. E não necessariamente eles faziam um teatro mudo. Mas, sim,
utilizavam o corpo para que todo o público aglomerado à sua volta entendesse o
espetáculo, uma vez que não contavam com aparelhos sonoros que permitissem que
as falas chegassem aos ouvidos de todos.
Na formação do ator, no entanto, a participação
da mímica ainda é bastante questionada, segundo o professor. Ainda assim, diz
ele, é possível perceber a presença da dramaturgia corporal na formação de
alguns grupos e atores, embora ela seja pouco valorizada.
Pesquisa
Os esforços dos estudos de Coutinho são voltados
especialmente para o desenvolvimento de procedimentos que auxiliem o ator a ter
melhor compreensão de sua posição em cena e daquilo que ele expressa. O
pesquisador explica que “é importante que o ator entenda que qualquer mínimo
detalhe pode alterar completamente a comunicação daquilo que ele criou enquanto
artista”, dando a ele maior independência em cena.
A pesquisa de Coutinho acontece em cena e
baseia-se, predominantemente, em dados empíricos. “Desenvolvo elementos
teóricos, mas só entendo se funcionam ou não quando estou no palco. O processo
é fechado quando vou para a cena”, conta. A partir dessas experiências, que
representam estímulos aos atores – entre os quais o próprio pesquisador –, são
selecionados aspectos que tenham qualidade de pesquisa e o professor passa a
trabalhar com isto.
Para auxiliá-lo em seu trabalho, o docente conta
com um grupo que tem cerca de sete outros atores, que se engajam conforme cada
proposta de pesquisa. Coutinho costuma assumir o papel de diretor, mas também
pode ser visto em cena. “O diretor não é quem concebe o espetáculo propriamente
dito, mas é quem aplica todos os procedimentos nos atores e pode observá-los.
Depois, quando estou em cena, tento aplicar em mim aquilo que vejo”, diz.
O trabalho de Coutinho conta com algumas
ramificações, entre elas estudos de improvisação. Apesar de não ser o foco
principal do projeto de pesquisa, a improvisação, a que o artista chama também
de “jogo”, acopla-se a ela por ser um dos instrumentos utilizados na atuação.
Além de espetáculos encenados pelo próprio
grupo, Coutinho conta que busca aplicar a pesquisa em outras peças para as
quais é convidado e até mesmo em projetos de cultura e extensão que ajuda a
desenvolver na área da saúde. “O corpo expressivo potente está presente em
todos os lugares. É um instrumento do ator, mas tem uma aplicação mais ampla do
que apenas no teatro”, explica.
Inserção
Desde 2010, o grupo tem participado de uma série
de festivais de teatro na América Latina, nos quais, além de discutirem
atuação, apresentam peças, fazem intervenções e promovem algumas oficinas
voltadas para a dramaturgia corporal.
Coutinho conta que, além do reconhecimento
internacional, um dos aspectos mais interessantes da integração do grupo a
estes festivais é a repercussão dada a seu trabalho, por se diferenciar do
teatro produzido por outros grupos latinos. “O teatro da América Latina é
predominantemente formado por grupos independentes, muitos deles políticos.
Eles têm na palavra, que é de protesto, o seu centro de trabalho. Então eles
ficam muito intrigados com a possibilidade de ficar uma hora em cena sem usar a
palavra para se expressar”, relata.
Esta diferenciação promove uma imensa troca de
experiências. O professor comenta que as atividades em que seu grupo envolve-se
contribuem para complementar o trabalho dos grupos latinos, mostrando-lhes como
o corpo pode falar no lugar da palavra. “Eles percebem que é possível ter um
discurso na ação. Complementar ou com o mesmo grau de importância que o
discurso verbal.”
Mais informações: (11) 3091 1622. sitewww3.eca.usp.br, email comunicaeca@usp.br
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