Por Professor Lindomar
O ator passa a existir juntamente com o teatro,
pois o ato estético coletivo de origem grega, tem seu alicerce no binômio
Ator-Espectador. Sem o ator em cena diante de um público não há teatro. O
título de primeiro ator da história do teatro no ocidente é do poeta trágico
Téspis, que representava vários papéis, simultaneamente, em suas peças. Era
comum não reconhecer os atores em cena nas tragédias gregas, pois utilizavam
grandes máscaras, figurinos alongados e tamancos altos de madeira, denominados
“coturnos”.
Os tragediógrafos gregos representavam os papéis
que escreviam, mais tarde Sófocles começou a desvincular este elo entre autor e
ator. Desde o surgimento do teatro as mulheres eram impedidas de encenar, e os
papéis femininos eram apresentados pelos homens. Só na “Commedia dell’ Arte”
que elas irão atuar no teatro de rua. A impostação de voz do ator grego era de
extrema importância, pelo uso da máscara e pelo local aberto das apresentações.
Quando o império romano se apropria da cultura
grega, assimila um teatro já decadente, com atores buscando um profissionalismo
de efeitos grosseiros e gratuitos. O público romano opta por espetáculos
circenses, jogos violentos e competitivos, e diferentes formas de corridas, não
valorizando a arte dramática. Sendo assim o ator começa a se especializar na
mímica, dança e acrobacia. Os mais compromissados com as artes dramáticas
migram para o campo, longe da cidade, praticando o mimo e caindo no gosto
popular. Com as invasões bárbaras no início da Idade Média, surgem os atores
trovadores e menestréis, pois os teatros haviam sido fechados e/ou destruídos,
e esses atores ambulantes passam a se apresentar em feiras, aldeias e cidades.
Neste período, um cristão batizado era proibido de assistir ou participar de
qualquer encenação teatral, exceto àquelas de caráter litúrgico, como os autos
e os mistérios.
No início do Renascimento as companhias ambulantes
passam a profissionalizar os atores da “Commedia dell’ Arte”, que começam a ser
contratados por senhores e nobres, para apresentação de suas “farsas” e
participações nos “triunfos”.
Na encenação oriental o ator é envolvido por
rituais e cerimônias religiosas. Na China o ator precisa dominar o gestual, o
canto e a palavra, pela simplicidade cenográfica e pela tradição da linguagem
simbólica de sua cultura. No Japão, o “Nô” e o “Kabuki” são as duas formas de
teatro mais conhecidas e tradicionais.
Ainda no Renascimento, quando o Triunfo e o teatro
de rua passam a ocupar os palcos de salas fechadas, o ator precisa reeducar sua
forma de atuar, isto porque o gesto sutil do ator em cena pode mostrar a
identidade da personagem, sem precisar dos recursos utilizados ao ar livre. As
biografias são típicas deste período do antropocentrismo, e com elas surgem as
“vedetes” do teatro. É na Commedia dell’ Arte que muitos atores e atrizes vão
fazer carreira com personagens fixos, alguns vivendo esses personagens até a
morte. No século XVI, o Queen’s College, em Londres, obrigava seus alunos a
assistirem ou atuarem nas encenações teatrais, e os que se recusavam eram
expulsos.
No Iluminismo do século XVIII, muitas idéias e
escritos filosóficos sobre a preparação e o trabalho do ator foram surgindo,
porém o primeiro trabalho mais significativo foi o “Paradoxo sobre o
comediante”, do francês Denis Diderot (1713-1784). No século XIX, surge a
linguagem dos “Melodramas”, onde os atores e atrizes são o foco de atenção na
encenação teatral, e o público vai ao teatro apenas para vê-los. É o chamado
“Academismo francês e italiano”. No final deste século o “Naturalismo” começa a
se firmar e o ator a se preocupar com a verdade cênica, ou melhor, a “fé
cênica”.
O russo Constantin Stanislavski (1863-1938)
dedica-se a produzir fundamentos e métodos para o trabalho do ator,
contribuindo com os livros “A preparação do ator”, “A composição do
personagem”, e “A criação de um papel”. Sua proposta era a que o ator lutasse
contra a falsa teatralidade e o convencionalismo, desta forma, utilizando as
bases do naturalismo psicológico, exigindo do ator, nos ensaios ou diante do
público, a concentração e a fé cênica, construindo assim uma “quarta parede”
imaginária. Suas idéias foram divulgadas no Brasil por Eugênio Kusnet.
Paralelo ao naturalismo de Stanislavski, dentre
outras, acontecia a concepção da “biomecânica” de Meyerhold (1874-1942), onde
atores apareciam em forma de marionetes com múltiplas habilidades cênicas. Uma
estética construtivista onde a quarta parede torna-se inviável. Gordon Craig
(1872-1967) chegou a propor uma supermarionete em cena, por achar que o ator
deveria ser menos sonoro e mais visual, dominando suas emoções em cena.
O ícone do teatro do século XX foi Bertolt Brecht
(1898-1956), que resgatou a estética do “teatro épico” e criou um teatro
dialético, onde o ator e espectador estariam em constante reflexão diante da
ação teatral. Enquanto Stanislavski propunha a “identificação” do ator e do
público com o personagem, Brecht acreditava no “distanciamento”, no senso
crítico. Esse “efeito de distanciamento” (Verfremdung effekt) também é
conhecido como “estranhamento brechtiano”.
No Brasil, as idéias de Bertolt Brecht foram
apresentadas por Augusto Boal (1932-), no seu “sistema de coringa”, permitindo
ao ator trabalhar com o distanciamento e em diferentes papéis. A estética
teatral de Augusto Boal é chamada de “Teatro do Oprimido”, com um arsenal de
suporte para o trabalho teatral crítico-reflexivo da realidade atual. Inclusive
é um método de teatro proposto também para não-atores.
Todos podem ser atores, seja no palco, no
trabalho, na escola, na rua, em casa, ... até invisível como propõe Boal . O
teatro é um ato estético coletivo, cabendo-nos certificar o nosso papel diante
do mundo contemporâneo.
Fontes
BERTHOLD. Margot. História mundial do teatro. São
Paulo: Perspectiva, 2004.
BOAL, Augusto. O teatro do oprimido e outras
poéticas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1983.
CARVALHO, Ênio. O que é ator. São Paulo: Brasiliense,
1987.
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